Em toda a região, 30% das empresas usam lenha como fonte de energia; adesão a planos de manejo ainda é baixa
SÃO PAULO - No Araripe, na divisa de Pernambuco com
Piauí, está o maior polo gesseiro do país. Com o incentivo à construção
civil, as fábricas estão a pleno vapor e respondem por 95% da produção
nacional. A notícia é boa. Mas o sertão nordestino, que a maioria só
ouve falar em tempo de seca, segue palco de contradições. Os fornos das
fábricas são, em maioria, movidos a lenha. É assim também em boa parte
do polo têxtil de Toritama, em Pernambuco, onde as caldeiras que tingem
tecidos fervem sob estalos de madeira, ou no Seridó, entre Rio Grande do
Norte e Pernambuco, onde olarias produzem tijolos e telhas para toda a
região. No Nordeste, hoje, 30% das empresas usam a lenha como fonte de
energia.
Por ano, são queimados 25 milhões de
metros cúbicos de lenha no Nordeste, o que equivale a desmatar 2.500
km2, mais que o dobro da cidade do Rio de Janeiro. Pouca gente se
incomoda com isso. Primeiro porque não se tem outra fonte de energia
barata. O problema, como diz o sertanejo, é que não se planta um pau. O
que queima nos fornos é lenha nativa e, pela lei, 20% da mata de
caatinga deveriam ser preservados em cada propriedade. No restante o
desmate é permitido, com autorização. Mas ninguém leva em conta. Segundo
o Serviço Florestal Brasileiro, 94% da lenha é ilegal, cortada e
queimada sem qualquer tipo de controle.
Numa
região onde o sol esturrica o solo, o risco é a desertificação. O
Nordeste possui hoje quatro núcleos de desertificação, onde a terra,
explorada sem qualquer preocupação em preservar alguma coisa, ficou
quase estéril. São 18.432 km2 na região do Seridó (RN e PB), Irauçuba
(CE), Gilbués (PI) e Cabrobó (PE). Pelo menos outros 98 mil km2 são
considerados em situação muito grave pelo Programa de Combate à
Desertificação e Mitigação dos Efeitos na América do Sul, o que equivale
a 10% do semiárido.
Este ano, o Ibama já realizou
várias operações para conter o desmatamento ilegal na caatinga. Na
Paraíba, onde Cariri e Curimataú são as áreas mais degradadas, foram
embargados 195,5 hectares em 23 propriedades. No Oeste da Bahia, foram
apreendidos mourões, estacas e carvão vegetal ilegais. No sertão do
Araripe, em Pernambuco, o embargo atingiu 547 hectares durante a
Operação Borborema, em desmate ilegal nos municípios de Ouricuri,
Granito e Arcoverde, onde a lenha abastece fornos de produção de gesso.
Falar
em semiárido e caatinga é quase sobrepor mapas. A caatinga ocupa 850
mil km2 em nove estados — 11% do território brasileiro. Apenas 5%, ou 85
mil km2, são Áreas de Proteção Permanente, segundo dados do Serviço
Florestal Brasileiro, ligado ao Ministério do Meio Ambiente.
Apesar
de o bioma caatinga ser pouco estudado, sabe-se que reúne cerca de 930
espécies de plantas, 148 de mamíferos e 510 de aves. A região abriga 30
milhões de pessoas, recebendo o título de semiárido mais habitado do
planeta.
Assim como os animais, as plantas são
fortes. Se cortada a 30 centímetros do chão, mesmo com pouca chuva, a
mata começa a rebrotar em nove meses. Mas, mesmo assim, para que a
caatinga não vire deserto, seria necessário que o corte, numa mesma
área, fosse feito a cada 15 anos. O drama do Serviço Florestal
Brasileiro, responsável por disseminar o manejo na região, é que, além
do desmate, as criações de gado, ovino e caprino também estão dizimando a
flora. Os brotos, quando despontam, são comidos pelos animais.
—
Todas as fazendas no sertão tem uma carga animal maior do que poderia
ter — diz Frans Pareyn, da ONG Associação Plantas do Nordeste.
Para
se ter uma ideia, para que a caatinga não fosse degradada, cada hectare
de terra com mata nativa poderia comportar de 10 a 12 cabeças de gado.
Se a caatinga já estiver raleada ou rebaixada (quando corta a árvore e
mantém o toco, para que rebrote), esse número cai para algo entre dois e
quatro.
Com a mudança climática mundial, a seca
na caatinga só tende a piorar. Este ano, praticamente não choveu. Se há
água de cisternas para beber, falta para os animais e para irrigação, o
que perpetua a pobreza. Sem cultivo e sem animal, o sertanejo vende o
que sobra. E, na maioria dos casos, o que sobra é a lenha. O preço, que
na indústria chega a R$ 30 o metro cúbico, na propriedade não passa de
R$ 10. O ganho fica no transporte.
A meta do governo é implantar o manejo florestal em uma área equivalente a 7% do bioma.
—
A lenha da caatinga sobrevive à seca e, mesmo com atravessador, rende
um bom dinheiro. É por isso que precisa ter o manejo — alerta Newton
Barcellos, chefe da Unidade Regional Nordeste do Serviço Florestal
Brasileiro.
Desde 2006, o Ministério do Meio
Ambiente financia programas de manejo, mas a adesão ainda é baixa. Este
ano, os recursos são maiores e somam R$ 8 milhões. O Fundo Nacional de
Desenvolvimento Florestal (FNDF) e o Fundo Nacional sobre Mudança do
Clima (FNMC) trabalham para implantar o manejo na região do Seridó,
Médio Sertão e Cariri Ocidental, na Paraíba, e do Sertão do Apodi, no
Rio Grande do Norte. Além de ensinar a técnica aos agricultores, é
preciso incentivar e financiar indústrias na modernização de fornos
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/pais/no-calor-da-industria-do-gesso-ruina-da-caatinga-no-nordeste-5549705#ixzz226cPwZZQ
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